dezembro 26, 2015

Inventar novos erros


Não é por se pregar nas igrejas que os pára-raios são nelas inúteis. 

(...)

Quem está apaixonado por si próprio tem pelo menos a vantagem de no seu amor não ter muitos rivais.

Boxing day?


(cartoon: Angeli)

dezembro 23, 2015

Quem pinta um alvo na janela do jardim pode ter a certeza de que lhe atirarão*



Já se sabia que os cidadãos teriam de pagar alguma coisa, mas três mil milhões de euros é um custo demasiado alto para que a sua [Passos Coelho] gestão neste caso mereça um mínimo de condescendência. (Editorial do Público, 22-12-15)

(*Lichtenberg)

dezembro 21, 2015

O resgate do soldado banif


ou como o simples facto de nascer neste país devia dar direito a indemnização...

Habemus baliza


Foi mais ou menos assim: durante praticamente todo o jogo e arredores, uma das equipas convenceu-se que a outra não tinha baliza e tratou (apenas) de defender a sua. Entretanto, a outra equipa convenceu-se que realmente não tinha baliza e que, mais tarde ou mais cedo, marcaria na baliza (supostamente existente) adversária. Neste caso, o deserto vaticinou um milagre em forma de baliza, a tal baliza que uma das equipas tanto acreditava que não existia, acabando por convencer a outra disso mesmo. Afinal a baliza existia, era imanente a um conceito remoto de jogo. Mas existia. Entretanto, resta-nos a consolação de a tradição ainda ser o que era. Acreditamos piamente que no momento certo falhamos, com ou sem balizas. 

dezembro 13, 2015

A porta secreta de uma casa secreta onde há uma porta secreta... (Haikús para Vila-Matas)


A Por el Abismo, jardín tragaaviones de la literatura. Por la Aventura, sentido último de la escritura. Por Paul Auster leyendo a Vila-Matas en su jardín de Brooklyn. Por Adonis que escribió que a los muertos hay que sepultarlos en el lenguaje.

B Por Borges, que está en la raíz de casi todo. Por Thomas Bernhard. Por Blanchot, que se comportaba como si estuviera muerto y decía que sus libros eran póstumos. Por Bouvard y por Bartleby. Por Bolaño y por el Barça pero sobre todo por el Barça. Por Bartleby y por Beckett, pero sobre todo por Beckett. Por Beckett y por Buster (Keaton), pero sobre todo por Buster (Keaton). Por Buster Keaton y por Chet Baker, pero sobre todo por Chet Baker.

C Por Sophie Calle siguiendo los pasos de Enrique.

D Por Duchamp. Por Dylan. Por Dominique Gonzalez-Foerster que le dio a Enrique la llave secreta de una puerta secreta que da a una habitación secreta detrás de la que hay otra puerta y otra habitación secretas, en el Pompidou. Por el arte de la desaparición, que es la esencia de la literatura. Por Dublín. Por Marguerite Duras.

E Por el éxito, que en palabras de Kertész, se consiga o no el camino que lleva a él es igual de ignominioso.

F Por Finnegans Wake y su estela inacabable.

G Por el cementerio de Glasnevin, junto al que se encuentra el pub de los enterradores, punto de encuentro de la Orden del Finnegans. Por Gombrowicz. Por Gregor Von Rezzori brindando con Gregor Samsa. Por Grand Central, en cuyas escalinatas Elizabeth Smart por fin pudo llorar.

H Por Hölderlin. Por el loco de Herisau, que escribió su último micrograma derramando su sangre en la nieve. Por Hemingway y las hordas de avatares que ocupan las páginas iniciales de París no se acaba nunca.

I Por los infraleves. Por Impostura. Por La asesina ilustrada.

J Por James Joyce, maestro de Beckett.

K Por Kafka, por Kassel, por Kertész.

L Por la lucidez de Lichtenberg. Por la literatura, que es a lo que se dedicó Pasavento cuando, harto de intentar desaparecer sin conseguirlo, no sabía muy bien qué hacer.

M Por Michel de Montaigne. Por la muerte de la metaliteratura. Por el mal de Montano. Por Marienbad. Por México, donde Vila-Matas logrará por fin desaparecer, como lo hicieron en su día Arthur Cravan y Ambrose Bierce.

N Por la literatura del No. Por Nueva York, que siguió siendo un relato soñado después de que Enrique la visitara, comprobando con asombro que existía.

Ñ Por las corbatas de ñandutí, tejido de textura similar a la telaraña, prenda de luto que los shandys están obligados a lucir cuando se les inflige un premio literario.

O Por Oblomov. Por los Odradeks. Por la Orden del Finnegans, que tras ocho años durante los cuales sus miembros se expulsaron unos a otros sin piedad, lograron por fin desaparecer.


P Por Pitol. Por Perec. Por Pynchon. Por Pessoa. Por París. Por Pécuchet. Por la literatura portátil. Por Philippe Petit equilibrista del fin del mundo que se paseó por el abismo que mediaba entre las Torres Gemelas de Manhattan.

Q Por Ednodio Quintero, que durante un viaje por México en el Tequila Exprés, le salvó la vida a Enrique, quien entre trago y trago, creyendo estar haciendo amigos, contaba “chistes de mexicanos” a un corro creciente de pasajeros, sin darse cuenta de que cada vez estaban más cabreados y lo iban a matar.

R Por Ramón (Gómez de la Serna). Por Rimbaud. Por Raymond Roussel royendo los huesos del realismo. Por Alejandro Rossi, que encontró la forma de su muerte en Mexico.

S Por Marcel Schwob. Por Sebald flotando en los anillos de Saturno. Por el silencio de Salinger.

T Por Tristram Shandy, que es la tercera parte del Quijote. Por Thomas el oscuro, la extraña novela de Maurice Blanchot.

U Por Ubu, rey de la vanguardia patafísica y anartista.

V Por la vanguardia, cuya esencia es estar siempre en vilo. Por el vilo de los viajes verticales. Por Vilnius y su ayudante. Por Veracruz en su lejanía. Por Valéry. Por la Verdad, que en el fondo es lo único que busca alcanzar Enrique al escribir.

W Por el cementerio de Woodland, en el Bronx, donde Jeremías Jiménez, policía de cementerios, nos mostró la tumba de Moby Dick. Por Robert Walser, príncipe discreto de la estirpe angélica de los escritores.

X Por los xoloxcuincles de Xalapa, los xoconostles de Xochimilco y los xilófonos de Xicoténcatl.

Y Por la literatura del yoyó también conocida como autoficción autoficción.


Z Por Zinedine Zidane arbitrando un partido entre Zambia y Zanzíbar en Zimbawe ante un público de zulús zurdos bajo la mirada atenta de un tal Enrique Vila-Matas, zapatero de Zacatecas, que nada tiene que ver con el escritor.

dezembro 09, 2015

Há, mas são verdes...



Ai, que saudades do futuro: cidades verdes, inteligentes, sustentáveis, resilientes (tinha que ser). As ideias pairam por perto, não fossem estas (ainda) à borla. Não o sendo, seria necessário relembrar o estado actual das nossas cidades: centros despovoados, ainda que turísticos, cada vez mais inacessíveis aos nativos, cada vez mais gentrificados em pseudo guetos gourmet (entre outras mostras de canonização do efémero). Enquanto isso, ruínas velhas e ruínas novissímas (esqueletos de edifícios nados-mortos) polvilham o espaço público urbano, supurando o pus da nossa indiferença, em viagem para o aconchego do centro comercial. Quem sabe onde eclodirá o próximo abcesso? Até lá, toca a desconstruir.



novembro 30, 2015

19

O espectáculo é o herdeiro de toda a fraqueza do projecto filosófico ocidental que foi uma compreensão da actividade dominada pelas categorias do ver; do mesmo modo que se baseia no incessante alargamento da racionalidade técnica precisa, proveniente deste pensamento. Ele não realiza a filosofia, filosofa a realidade. É a vida concreta de todos que se degradou em universo especulativo

("a sociedade do espectáculo", Guy Debord)

novembro 27, 2015

Diga coisas Sr. Bolaño


Não gostava da unanimidade eclesiástica, clerical dos comunistas. Sempre fui de esquerda e não ia virar à direita só por não gostar dos sacerdotes comunistas, pelo que me tornei trotskista. O problema é que, uma vez no seio dos trotskistas, também não gostei da unanimidade clerical deles, pelo que acabei por ser anarquista. A unanimidade aborrece-me imenso. Sempre que me apercebo que toda a gente está de acordo em alguma coisa, sempre que vejo que toda a gente está a fazer coro para amaldiçoar alguma coisa, aflora-me qualquer coisa à pele que me faz rejeitá-la. 

(in entrevista a Eliseo Álvarez, 2005)

novembro 18, 2015

Longa se torna a espera



a versão da Sétima Legião:




A versão do Sr. Silva e seus acólitos sustenta que estes dispõem de todo o tempo do mundo. O processo de mumificação das eleições do passado dia 4 de Outubro de 2015 está em curso. Bem hajam. 



(AJG)

novembro 16, 2015

lembras-te querida?



OITO MILHÕES de euros depois


A Câmara de Braga tinha gasto oito milhões de euros na tal estrutura (diz que seria uma piscina olímpica), mas não tinha dinheiro para terminá-la (desde 2008). Pronto, não se fala mais nisso. Entretanto resolveu ceder a dita (onde já havia gasto OITO MILHÕES) ao SC Braga para este (supostamente) construir um pavilhão multiusos. Sucede que o Braga praticamente não tem modalidades profissionais de pavilhão (talvez faça jeito à secção de natação ou de futebol de praia), mesmo o futsal é uma parceria com AAUM (Associação Académica da Universidade do Minho). Pergunta(s): já agora, onde ficam o ABC e o Hóquei Clube de Braga na fotografia? Não ficam? Não são da cidade? Mais milhões menos milhões, lá ficaremos nós enfeitados com mais um desses elefantes brancos da modernidade. Talvez o sr. Carreira apareça para a inauguração. E não se fala mais nisso.

novembro 14, 2015

...

Isto não é Paris
nem são cinco da tarde
nem chove
nem há cómicos na rua
e tampouco nesta esquina
desta cidade que não é Paris
há um realejo surpreendido
e um pintor boémio
e uma garrafa de vinho
porque às cinco da tarde
esta cidade não é Paris
e não existe um amor curioso
escondido atrás da cortina
enquanto Edith Piaf canta
Les amants de Paris
Nem a recordação do Sena
me leva as minhas memórias tristes
desta cidade sem noite
nem espelhos de mel
e não minto se disser
que Paul Éluard saiu do meu quarto
com asas de melro branco
pela janela desta cidade
que não tem pombas nem bêbados alegres
porque às cinco da tarde
esta cidade não é Paris.


"Isto não é Paris", Uberto Stabile

novembro 08, 2015

O silêncio do abandono ou o abandono silenciado?





Há duas formas de olhar para as rápidas transformações por que o mundo passa. Muitos vêem sobretudo o que muda, outros procuram surpreender o que, a despeito delas, permanece.
Orlando Ribeiro


Faz falta um outro livro com as novas ruínas, essas ruínas novíssimas que engalanam o nosso país: edifícios inacabados, com os seus esqueletos ao leu (não faltam aqui por Braga), edifícios abandonados à nascença, despejados no lixo (e alegres recipientes de lixo), edifícios abandonados por desleixo por incompetência por manifesta falta de condições; estradas que não vão dar a lado nenhum, auto-estradas em duplicado triplicando os custos para todos ao longo da sua morte lenta. Tudo isto dá bem com os cortinados da sala de visitas da nossa modernidade serôdia, esse progresso que nos alimenta, enfeitando-nos os dias. Outras ruínas se vislumbram e são de carne e osso (ou eram). 

le coq sportif

novembro 04, 2015

Cidade(s) fantasma

Kilamba Kiaxi: O (pseudo) urbanismo ao serviço do poder. Diz que Angola é uma democracia, deve ser daquelas que alguns denominam, sem se rir, de "musculadas". Uma questão de poder pagar o ginásio...

novembro 03, 2015

Crónica de uma morte anunciada


Calvão da Silva daria certamente um bom regente da disciplina de religião e moral. Como é que este senhor chegou a ministro é que não conseguimos conceber. Rogai por nós...

outubro 19, 2015

a olhos vistos



(clica na imagem)

A verdade, digam lá o que disserem,
é que tivemos muito pouca sorte
com os poetas (?) nossos contemporâneos.

Um nasceu em Galveias e tatua-se
ou alfineta-se para disfarçar um vazio evidente;
outro gosta de andar nu em Braga,
muito depois – e aquém – de qualquer Pacheco.
(Ignoram, ambos, que a única pila maior
do que o mundo era a do João César Monteiro.)

Um terceiro, cujo nome nunca escreverei,
é a mulher moderna da edição
às cegas e da sacanice quotidiana. O quarto
ou o quinto (gabo quem os logra distinguir)
arrotam melancolia e não admitem
o mínimo desvio à sacrossanta transfiguração da lírica.

O sexto – não, não me apetece falar aqui do sexto.

Consola-nos, isso sim, saber que uns se tornaram
entretanto romancistas (pilim, pilim), e que os restantes
hão-de ser, muito em breve, ministros
ou apenas pulhas (é, no fundo, a mesma coisa).

Enquanto, de esgoto em esgoto,
Portugal progride a olhos vistos
e é bem capaz de levar, um dia destes,
com outro Nobel nas trombas.


"Inventário Plebeu", Manuel de Freitas, in Piolho (2011), revista de poesia.

outubro 18, 2015

Era estranho estar morto...

Atrevo-me a dizer que é uma coisa boa localizar tão rapidamente quanto possível o nosso próprio ridículo.