novembro 27, 2018
novembro 23, 2018
Truques de glória
Estou há mais de dois meses para escrever algo sobre o “Paterson”,
um filme de Jim Jarmusch, mas por razões alheias à minha vontade, razões essas absolutamente
indetermináveis, pelo menos até à hora em que escrevo estas linhas, tal não foi possível, ainda
tentei contactar o escriba, isto é, eu próprio, mas tal não foi também, de todo, possível.
Fica para outro dia. O personagem principal deste filme chama-se Paterson, e a
cidade onde a acção se passa também se chama Paterson, razões mais que
suficientes para o filme se chamar Paterson. Paterson é uma espécie de poeta
condutor de autocarros. A sua vida é um rame-rame que apenas nos chama atenção
pelo facto de escrever poesia. Se fosse um rádio amor condutor de autocarros
seria muito mais difícil a sua recepção em Cannes. A mulher de Paterson é uma
idiota com a mania de ser artista, o que é muito comum nos dias de hoje, tanto
uma coisa como a outra. O Jarmusch sabe bem isso, é um diletante, gosta do
Paterson na medida em que este não tem telemóvel, escreve poesia e, às vezes,
lá bebe um copo quando vai passear o cão ou levar o lixo, já não sei, mas fico
com sensação que a acção poderia ser em, digamos, Amarante, também deve por lá
devem haver poetas que gostem de outros poetas, embora sem conhecerem (não vem
mal nenhum ao mundo) o William Carlos Williams. Jim Jarmusch vai-se aborrecendo
ao logo da realização do seu filme ao ponto de fazer com que Paterson, por obra
do demo, fique sem o seu caderninho de poemas, sem ter tido tempo de o
fotocopiar. Ficamos todos muito chateados e solidários. Nós, e a menina que a
páginas tantas lhe lê um poema, ao nível dos dele, ou de qualquer outro
condutor de autocarros poeta, para não dizer de WCW. Todavia, Paterson, embora
chateado (nota-se algum esforço do actor nesse sentido) continua a conduzir o
seu autocarro (não é à toa que o nome do actor é Driver), mas ficamos sem saber
se alguém lhe terá dito que não é o fim do mundo, que também Herberto Helder perdeu
um manuscrito original num comboio, coisa que lhe terá provocado uma profunda
angústia de duração não inferior a seis meses. Não sabemos, ainda, se Paterson
ou mesmo Jarmusch sabem da participação de HH numa curta de 1968. Saberiam?
Saberão? Como reagiria, ou reagirá Cannes? Não sabemos, é um perfeito enigma.
(Paterson a escrever os seus poemas, acho)
novembro 22, 2018
Tourear as pedreiras
Não é, de todo, civilizado, falar
sobre civilização. E com isto teríamos encerrado o assunto, ainda a tempo de
ver o Macgyver no canal memória. Mas não. Quando a ministra (da cultura, dizem)
escorregou no termo civilização, não
se terá recordado (saberia?) que muitas disputas terão começado por muito
menos. Quando invocamos civilização, necessariamente distanciámo-nos do
“outro”, o bárbaro. Já era assim entre gregos e persas, ou entre romanos e os
povos do Norte. É assim entre sportinguistas e benfiquistas. Temos que ter
alguma cautela quando barricamos o nosso pensamento em facções. As barricadas
são lugares inseguros. Temos um ou dois livros que confirmam isso mesmo.
Cheguei às touradas como em tudo
na vida pré-história dos anos oitenta (do século passado): através da RTP. Às
touradas, ao TV Rural, às novelas brasileiras, ao Júlio Isidro, ao Duarte e
Companhia, ao Zé Gato, ao Verão Azul, e ao cinema, muito cinema. Anos setenta
(apanhei o final), oitenta, noventa. E não sou o único a dizê-lo. Das touradas
só sei o que vi na TV. A mesma coisa para os saltos de esqui, coisa que via
religiosamente no ano novo. Não frequento e nunca entrei numa praça. Conheço
alguns touros por percalços da minha imaginação, ou de viagens pelo país. Quase
sempre a Sul. Sei que existiu um tal de campo dos toiros em Barcelos, no século
XIX, provavelmente relacionado com a feira semanal, longe de ser caso único no
Minho. Resquícios de tudo isso se vislumbram na vaca das cordas de Ponte de
Lima. Com travessia para os Açores. Bovinidades sem toureiro a cavalo, sem
forcados, sem bancadas, normalmente integradas em festividades ou em promoção
pecuária. Na minha terra já ninguém se recorda disso, o que não quer dizer que
não tenha existido.
Não gosto de touradas sejam elas
quais forem. Os toiros concordarão comigo. Mas não partilho o endeusamento e a
moda dos bichinhos que se vive por aí. Num filme de 1990, Anjos Caídos, protagonizado por Sean Penn e o Gary Oldman (assim de
cor), a páginas tantas fala-se sobre a apropriação do bairro da sua infância
(descendentes de Irlandeses) pela especulação imobiliária, tomado aos poucos
por yuppies que trazem os seus animais de estimação para dentro dos seus
modernos apartamentos. Um comportamento bárbaro segundo os locals, habituados a animais soltos e não aprisionados em
apartamentos. Para isso temos as pessoas.
Ora, essa moda dos animais em
apartamentos demorou mas chegou cá ao burgo. Poderia dar milhares de exemplos
de animais verdadeiramente abandonados durante todo o dia em marquises,
garagens, terraços, ou simplesmente em salas, alguns a gritar (de felicidade?)
durante todo o dia. Assim vai o amor incondicional pelos animais. Lá chegaremos
ao toiro numa loja de porcelanas, 2º esquerdo. E os preços das habitações continuam
a disparar. Já repararam, ou não é importante?
Parece que as pedreiras não se enquadram na
logística civilizacional. As pedreiras são técnica, antes de serem comércio ou
indústria. E, como tal, devem ser da responsabilidade de técnicos. Ponto. Comunicada
a informação técnica, quando esta existe, a responsabilidade passa a ser
política. Se há uma pedreira e uma estrada, certamente que haverá gente.
Sabemos que não é de estimação, mas podíamos, ao menos, deixar de tentar disfarçar.
Estranha forma de continuar a escrever a mesma coisa (sem que a gente deixe de a ler)
No fim de contas, a minha conferência sobre a «estrutura mítica do herói» - essa tagarelice que vinha a repetir havia anos sempre que me convidavam - tinha-a copiado integralmente do livro de um intelectual português, Manuel da Cunha.
novembro 18, 2018
As touradas e o património da bovinidade
Sobre este assunto tenho a dizer que as casas em Braga estão a ficar muito, mas muito, caras, tanto para alugar como (para quem é louco) comprar, já para não falar de outros preços, coisas de turistas, ou de malta que desagua enganada em terras de terras santa cruz ao contrário. A todos desejo um bom espectáculo. Ou isso.
(Bartoon, de Luís Afonso, 30/07/2010)
(Bartoon, de Luís Afonso, 30/07/2010)
O meu país a saque
(cortesia daqui)
A pouca begonha continua. Mais uma contribuição para o museu da contrafacção: a candidata (única) à liderança da JS com erros no currículo, parece que anda a dividir as hostes. Pudera, estas coisas começam a ter algum eco no rapar do tacho. E o eco é chato.
novembro 16, 2018
Para uma nova taxonomia dos afectos
Tenho um amigo sportinguista que tem sempre teorias sobre tudo. Por isso mesmo não precisa da Netflix para nada. Desta vez engendrou uma teoria da conspiração que dá bem com o seu humor (quando não se fala do Sporting), embora ele não se aperceba. Essa teoria diz mais ou menos o seguinte: a detenção de Bruno de Carvalho (e do Mustafá) a um domingo e perto da hora do jogo foi responsabilidade do próprio (embora não saiba explicar como) e dos seus novos (velhos?) amigos benfiquistas, para (mais uma vez, diz ele) ocultar e deixar passar em claro os e-toupeiras, emails, e por aí fora, até porque hoje tem início a instrução do e-toupeira. Desta forma, o ruído instalado superaria tudo. Quanto ao ruído e às patetices dos jornalistas e comentadores não poderia estar mais de acordo, relativamente ao resto, fico agradecido por vivermos num país onde o humor (e a imaginação) suplantam, em muito (ainda), o horror. Embora o Artur Albarran não o saiba.
Este amigo é um apoiante (enganado, claro está - diz ele) de primeira hora de BdC. Ele e muitos. Os mesmos que agora (recentemente) se juntam em fila indiana, batendo-se por serem os primeiros a atirar a primeira pedra. Não estivéssemos perto do Natal e dir-se-ia que a Páscoa era a época festiva que vivíamos, divertidos, tantas são as crucificações em praça pública, tantos são os que acompanham a via dolorosa, julgando e enxovalhando quem passa (caído em desgraça). Isto é, quem foi detido. Duas ou três passagens pela TV e percebemos que todos o sabiam, ou pressentiam, ou tinham avisado, o que tarde ou mais cedo seria inevitável. Todos os outros: enganados. Vê-se muito disto nos divórcios.
A forma como a imprensa (vamos chamar-lhe assim, à falta de melhor) cobre estas (e outras) detenções, estando previamente nos locais, tendo acesso a informação (supostamente) em segredo de justiça, diz-nos bem da formosa estrebaria (esta foi roubada a um viajante do século XVIII) em que vivemos. Fosse esta imprensa tão avisada noutras situações, fizesse investigação verdadeira e reportagem a sério e seríamos o Bas Dost da imprensa europeia.
Mas não se pense que a imprensa é o melhor disto tudo. Os comentadores (a soldo de quem agora?) são a cereja no topo da estrebaria (já sem tanta formosura). Passe a gritaria, passe a ignorância, o dinheiro a jorrar (não é só para as claques, estes tipos descobriram as claques agora, parece, como se fosse possível assobiar para o lado consoante a cor da camisola), mas o que não passa, ou não pode passar incólume, é aquela velha forma de adaptação ao status quo vigente, seja ele qual for, capacidade apenas disponível ao nível dos invertebrados. O meu amigo deve ter uma teoria para isto. Depois pergunto-lhe.
(originalmente publicado aqui)
novembro 13, 2018
novembro 12, 2018
E assim aconteceu
As leis iam mais longe. Não se tratava de uma mera proibição de outras práticas religiosas. Era a imposição activa do Cristianismo a todos os pagãos pecadores do império. As estradas do erro estavam a ser encerradas pela força. Todos tinham, agora, de se tornar cristãos.
De borla
(na lata)
Sobre o (suposto) trabalho voluntário, uma onda trendy muito em voga, que sustenta a "eventologia" (termo cunhado por Alain Bourdin) que pastoreia os nosso dias, entre festivais, eventos (supostamente) desportivos, sociais, tecnológicos, servidos à mesa por jovens (e menos jovens) de alma vaga, à procura de um lugar ao sol, devidamente peneirados. É um mundo de exploração sustentado pelos impostos de todos. Ou, pelo menos, de alguns. Duas crónicas recentes chamaram-me a atenção:
- Borlas & porreirismo: é a cultura, estúpido!; de João Pedro George
- Não vás ao engano; de Henrique Raposo (sim, do Henrique Raposo)
A minha tese de doutoramento (onde vai ela???), seria sobre isso: o nosso mundo é um evento, ou um parque temático, se quiserem. Talvez um dia. Mas não de borla.
Mau tempo no canal
Na segunda parte não contei um remate enquadrado com a baliza. Pouco importa. O Bas Dost chega e vai sobrando (já o tinha feito na primeira parte) para as encomendas, e o Acuña, vá-se lá saber porquê, tem a mania de dar alguma intensidade ao jogo, ainda que inconsequente. O Bruno Fernandes desde que conviveu em conferências de imprensa com o Cintra (e, quem sabe, com o seu amigo que percebe de futebol) teima em não encarreirar no jogo, pelo menos dentro de campo. Até nisso há mão do Peseiro. O Nani vai-se passeando de peito feito, cabeça levantada, mas sem futebol digno desse nome. A sensação que fica é que o Gudelj até passa por jogador da bola neste conjunto de banalidades, e o Gaspar continua a marcar bem com os olhos. Raramente uma jogada sobrevive, faça chuva ou faça sol, a um ou dois toques com desmazelo à mistura.
Acabamos à toa, contra dez. Talvez por isso terá entrado o Misic, para equilibrar as coisas. Ganhámos, com ou sem casos, lá ganhámos. Mas não conseguimos enganar ninguém, a não ser os próprios. Não há chuva ou vento que nos leve a ilusão. Nem em Lisboa.
(publicado originalmente aqui)
novembro 11, 2018
novembro 04, 2018
Duzentos anos do Prometeu Moderno
Há algo a agitar-se na minha alma que eu não entendo. Sou um homem muito diligente, cuidadoso e perseverante no trabalho, mas, além disso, existe um amor pelo maravilhoso, uma crença no maravilhoso, interligados em todos os meus projectos, que me impelem para fora dos caminhos comuns percorridos pelos homens, até mesmo para o mar revolto e as regiões não visitadas que estou prestes a explorar.
(Nota: já volto com notícias de Barcelona)
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