Os meninos das escolas secundárias
fumam ganza nas paragens do eléctrico. Os meninos das escolas primárias aguardam a sua vez na fumarada. O companheiro Crato apoia tirando-lhes um tempo lectivo de curtição. Não é bem assim: deixemos esta missiva a quem sabe do que fala e não é certamente de ganza que se trata. O lado de uma professora de AECS que não está a achar piada às novas medidas aplicadas às escolas de 1º Ciclo:
Porque há coisas
que me chateiam e começam verdadeiramente a revoltar, sinto que está na hora de
dizer o que uma professora de AEC (Atividades de Enriquecimento Curricular, e
não Extracurriculares como muitos gostam de chamar) acha desta polémica
recém-criada (mas não inteiramente nova) de abolir um dos tempos das AECs,
nomeadamente entra as 15:45 e 16:30, tornando-o curricular, deus sabe com quê
ou com quem.
O Sr. presidente
da Confederação Nacional das Associações de Pais diz respirar de alívio, pois
está assegurado o encarceramento, peço desculpa, o preenchimento do dia escolar
até às 17:30, sem custos para as famílias. Continuo a perguntar com quê ou com
quem, dado irrelevante para este porta-voz dos encarregados de educação.
Irrelevante é
também o que vai ser dos professores, peço desculpa novamente, dos técnicos das
AECs. Nem uma palavra se ouve acerca destes, o vazio, o não-assunto. O Sr. João
Dias, da FNE alega que aplaude a medida, desde que, passo a citar, “daí não
resultar um acréscimo das horas de trabalho dos professores, antes uma melhor
gestão dos recursos existentes” (Jornal
Público,
10-05-2013).
Pois, mas deste
lado, está uma professora de inglês, licenciada em 2004, por uma destas
universidades públicas portuguesas a sério, na extinta “licenciatura em ensino
de inglês e alemão”, pré-Bolonha, que trabalha nas AECs desde 2005 e que sabe,
apesar da categorização pouco meritória ou inexistente pelos colegas
professores (não pelos técnicos, naturalmente), que é uma excelente
profissional. Alguém que sempre acreditou nas potencialidades do ensino precoce
de uma Língua Estrangeira e se dedicou não só profissionalmente, mas também
academicamente, escrevendo uma dissertação de mestrado, denominada “Ensino do
Inglês no 1º Ciclo do Ensino Básico: percepções dos intervenientes” e
frequentou inúmeras acções de formação a fim de melhorar a sua prática
profissional, que era inicialmente voltada para o 3º Ciclo e Secundário. A
mesma que continua a ser reconhecida por gerações de alunos (reconhecidamente
já serão algumas) e se apresenta diariamente para cumprir a sua função: ensinar
inglês, muitas vezes sem materiais de apoio adequados (faltam livros, leitores
de CD e até cadernos diários), mas com muita vontade de ensinar crianças, que
de outra forma, não teriam condições materiais, claro, de aprender uma Língua
Estrangeira.
E como eu, há
muitos, desde aqueles que introduzem compositores clássicos e até ensinam as
crianças a tocar Vivaldi nas flautas, àqueles que fazem cenários para festas de
finais de ano e se deitam às tantas da manhã e que nem sequer são devidamente
reconhecidos, sendo que a professora titular de turma se apressa a reclamar a
autoria perante um encarregado de educação que elogia o trabalho.
Também há
outros, sim, aqueles que não sabem como acalmar 25 crianças aos berros, que nem
sequer sabem o que andam ali a fazer, que faltam, que não são pontuais. Mas não
os há em todo o lado?
Sim, no ano que
se aproxima, estarei desempregada, com 32 anos. Continuarei a tentar trabalhar
noutras áreas, embora saiba que, assim que virem a minha formação inicial, me
excluam imediatamente, continuarei a dar explicações em centros, a dar aulas
individuais em casa (bendita OLX). Continuarei a minha independência
financeira, a minha casa, que mantenho desde os 22 anos.
Tentarei outra licenciatura, recusarei a emigração. Mas horários de 5 horas,
não obrigada!
(explicacoes.bracara@gmail.com)