janeiro 21, 2013

Oh, fale-nos um pouco de si signori Fabrício



O príncipe eludia-se ao julgar Fabrício discípulo da tia; as pessoas de espirito que nascem no trono ou ao lado dele não tardam a perder toda a subtileza de tacto; proíbem, à sua volta, a liberdade de conversação, que se lhes afigura grosseria; não querem ver senão máscaras, e pretendem julgar a beleza da tez; o mais engraçado é julgarem-se cheios de tacto. Neste caso, por exemplo, Fabrício acreditava em quase tudo quanto lhe ouvimos dizer; é certo que não pensava duas vezes por mês em todos esses grandes princípios. Possuía gostos apurados, tinha espírito, mas não lhe faltava a fé.
O gosto da liberdade, a moda e o culto da "felicidade do maior número", de que o século XIX se apaixonou, não passavam a seus olhos duma heresia que há-de passar como as outras; mas ao cabo de matar muitas almas, tal como a peste mata muitos corpos enquanto reina numa região. E, apesar disso, lia deliciado os jornais franceses, e até cometia imprudências para os obter.

“A Cartuxa de Parma” (pp.150) , Stendhal. Tradução de Adolfo Casais Monteiro. Relógio d’Água.

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