Telmo não se
compadecia com a disciplina imposta aos educandos pela férula e a vergasta. Da
pauta pedagógica não se fala. A regra fazia carneiros e aquele menino gostava
de pensar, bem ou mal, pela sua cabeça. Os alunos (…) não precisavam de ter
mais ideias que aquelas que lhes ministravam os padres-mestres, por sua vez
metidos dentro das velhas sebentas aristotélicas. Como tal, carecendo de ideias próprias, a
tendência natural, era que as não admitissem nos outros. Tratava-se, bem
entendido, de ideias comezinhas, de trazer por Braga ou por casa, nada se
parecendo com a prova ontológica, sol do sistema divino, mas ideias
subalternas, ideias ínfimas de que se compõe a personalidade do fabiano em
geral e do braguês em particular. Ora Telmo, rico, rebelde, malcriado, mimalho,
era o contrário de tais tortulhos, com dentes alçados para o açafate da vida. Toda
a questão para eles estava nesta habilitação. Faziam-na encornando bem os
compêndios e autores dos programas. O “quid”, por conseguinte, consistia em ter
memória. A memória pedia-se à milagrosa Santa Catarina, advogada dos
estudantinhos junto do Espírito Santo. Pedia-se-lhe todas as manhãs à missa
obrigatória, ao terço obrigatório, e mais rezas litúrgicas ao sentarem-se e
erguerem-se da mesa. Telmo, que não compartilhava de magro refeitório colegial,
era havido como libertino. Libertino de pensamentos e obras.
“A casa grande de Romarigães” (pp.253-254), Aquilino
Ribeiro. Bertrand Editora
[imagem fumada]
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