“Erdosain era o vértice daquele triângulo formado pelos três homens sentados. O Rufia Melancólico e o Astrólogo entreolhavam-se de vez em quando. Haffner sacudia a cinza do cigarro e depois, com uma sobrancelha mais erguida que a outra, continuava a examinar Erdosain dos pés à cabeça. Por fim, acabou por fazer-lhe esta estranha pergunta:
– E tinha alguma satisfação em roubar?...
– Não, nenhuma…
– Então porque é que anda com os botins rotos?
– É que ganhava muito pouco.
– Mas então o que roubava?
– Nunca me ocorreu comprar botins com esse dinheiro.
E era verdade. O prazer que experimentou ao início por dispor impunemente do que não lhe pertencia depressa se evaporou. Um dia, Erdosain descobriu em si a inquietude que faz ver céus ensolarados como se fossem negros, cobertos por uma fuligem que só é visível para a alma triste.”
“Os sete loucos” (pp. 35), Roberto Arlt.
Edição da Cavalo de Ferro. Tradução de Rui Lagartinho e Sofia Castro Rodrigues.
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