A chegada de Keiser despertou as
luminárias da bola, todas elas versadas em futebol holandês e croissants
amanteigados. Com as primeiras vitórias o desassossego instalou-se (Bernardo
Soares escreveu sobre isso), e tiveram que se arranjar duas ou três explicações
para o fenómeno enquanto se entrevistava Jorge Jesus algures no médio oriente.
Após as primeiras derrotas, um dos analistas avançou com um ou dois pensamentos
que fizeram escola no liceu de Carrazeda de Ansiães: nas vitórias os oponentes
eram fracos, nas derrotas os oponentes eram consideravelmente superiores. Por
exemplo, o Tondela. Do lado dos fracos ficava o Rio-Ave, a mesma equipa que o
analista havia elogiado pouco tempo atrás como grande candidata ao quinto
lugar. Em Carrazeda, duas teses de finalistas explicam em dezoito páginas esta
linha avançada de pensamento.
Entretanto, uma convenção de
treinadores portugueses reunia-se para discutir o calendário do cozido à
portuguesa nos estágios e a importância das chicotadas psicológicas num curriculum
vitae que se preze. José Mota foi um dos oradores mais aplaudidos. Lito Vidigal
e Jorge Simão terão sido vistos a trocar papelinhos suspeitos. Conceição
dissertou sobre bipolaridade: uma coisa é quando se ganha, outra quando se
perde. Aplausos. Este debate foi seguido com muita atenção por todo o país.
Mais ou menos por essa altura,
talvez um pouco antes, um conhecido dirigente terá visto a luz. Primeiro ainda
se pensou que este iria a caminho do estádio com o mesmo nome, mas não,
estávamos apenas a entrar num território bem conhecido do futebol português: o
espiritismo. Quem diz espiritismo diz mezinhas, bruxaria, capelinhas, ou apenas
feelings. Talvez seja por isso que o treinador contratado de seguida pelo
dirigente que viu a luz, seja um expert em feelings. Tudo coisas que um
treinador holandês, não possui, nem nunca possuirá, obviamente. A associação de
treinadores portugueses que vão para os jogos de motorizada, aplaudiu com
agrado.
Se possível fazer golos. Foi mais
ou menos assim que Abel Ferreira lançou o jogo da meia-final da taça da liga
contra o Sporting. Ainda não se descobriu outra forma de ganhar jogos, mas
Abel, ainda assim acrescentou: e se possível não sofrer. Diz isto em todos os
jogos, e apostamos que nas convenções de treinadores portugueses também, mas é
sempre bom escutar estes pensamentos. Como já se sabia que o Braga ia à final,
embora tivesse que marcar mais golos que o adversário, ficava apenas em
suspenso quem seria o oponente. Salvador, lá no íntimo (como muitos bracarenses)
preferia o Benfica, mas a conduta do dirigente que tinha visto a luz ao ir
buscar dois jogadores ao Leixões com quem o Braga tinha (supostamente) acordo,
deixou Salvador triste. Embora traído reagiu com elevação, à imagem do ano
passado quando a altercação era com BdC e o Sporting.
Depois aconteceu aquilo: o VAR
foi ao BAR, ou ao contrário, existem várias versões. Registe-se a conduta
digna, urbana e elevada dos dirigentes mesmo na derrota. Um dos árbitros
decidiu até auto suspender-se por se achar indigno de acompanhar tão ilustres
personagens. Entregou-se a taça ao Porto, com o jogo da final a servir apenas
de consagração. Sérgio Conceição apelou (sem se rir) ao desportivismo e
contenção relativamente aos árbitros. As favas contadas chegaram a uns colegas
meus de trabalho. Antes do jogo já estava três a zero. Chegou o dia e foi o que
se viu e se poderá ler na excelente posta anterior do Rui. No final,
destaque-se, mais uma vez, a conduta
digna e elevada, tanto de treinadores como de dirigentes do Porto. A nova
modalidade de lançamento de medalhas avançará inexoravelmente rumo às
olimpíadas. Está tudo na nova dissertação de Conceição aos peixinhos, perdão,
aos treinadores portugueses. O mestre Madureira, da claque, também estará
presente. Por via das dúvidas.
(originalmente publicado no aqui)
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