março 27, 2013

A metalinguagem do reino monera


Companheiro de luta Passos, vamos mal quando não sabemos se Passos se soletra Gaspar, embora já há muito que saibamos que se soletra(va) Relvas de trás para a frente. Aliás, temos algumas dúvidas relativamente a Pedro, não será Miguel, ou Vitor? Bom, talvez Passos se leia Borges e Pedro se leia António, uma questão linguística que de qualquer modo o senhor nunca iria compreender. De Borges – que já sabíamos que é companheiro – ficamos também a saber que a sua empresa recebeu do Estado no último ano 300 mil euros. Não só aconselha como negoceia com o governo, mas quem paga é o Estado.

Companheiros não faltam. Carvalho, para nossa surpresa(?) também é soletrado por Passos, facto que se confirma com a criação de um lugar para o ex-espião(?) Silva na Presidência do Conselho de Ministros, com efeitos a partir de 1 de Dezembro de 2010. Por falar no companheiro de luta Silva Carvalho, este não tinha um processo judicial contra Passos e Gaspar?

Quando escutamos os murmúrios ruminados do companheiro de luta Cavaco, ficamos logo a saber que a evolução tem umas contas a ajustar com algumas mioleiras estacionadas algures numa garagem craniana. Diz o companheiro Cavaco que a inflamação da glândula retórica trasladada de um cortejo fúnebre político-partidário poderá não acrescentar um cêntimo à economia. Muito menos aqui por casa, digo eu. Nestes momentos percebemos que os beatos da linguagem económica ainda continuam no seu minúsculo reino monera, assistindo ao naufrágio do corpo que infectam. Percebemos também a razão visionária de Guy Debord (A sociedade do espectáculo), quando este reconheceu a falha num sistema que talvez libertasse momentaneamente as sociedades (industriais) da pressão na luta (imediata) pela sobrevivência, mas que estas nunca se libertariam do seu (suposto) libertador. Por falar em libertador, ainda existem sociedades industriais? Aqui por perto não se vê nada.


[fotograma de "Pamplinas Maquinista" (The General), Buster Keaton]

O espião que está sempre no quentinho


março 26, 2013

"Uma longa nota de rodapé para abrir um assunto sério"


O começo do “Ravelstein”, coisa que me escoltou algures no fim-de-semana, é simplesmente fabuloso. Tomem lá o primeiro parágrafo e é se querem.


É curioso que os beneméritos da humanidade sejam pessoas divertidas. Pelo menos na américa é com frequência este o caso. Quem quiser governar o país tem também de o entreter. Durante a Guerra Civil, as pessoas queixavam-se das anedotas de Lincoln. Talvez ele pressentisse que a seriedade estrita fosse bastante mais perigosa do que qualquer piada. Mas os críticos consideravam-no frívolo e o seu próprio Secretário de Estado o achava um brutamontes.(...)

"Ravelstein", Saul Bellow. Tradução de Rui Zink. Teorema. 

[ei seneca]

março 22, 2013

O continente dos mortos vivos [o verdadeiro Zombieland]



A questão zombie não é de somenos: existe, ou existia, um estado com um sistema financeiro muito particular, – este muito particular é o busílis da questão zombie – tão particular que nos remete para peculiar ao mesmo tempo que nos cabeceia em privado e nos amortece com a sua fugacidade íntima. Este sistema bancário, perdão, financeiro, tinha uma dimensão muito superior à economia de um país(?) chamado Chipre, ao qual supostamente pertencia, pormenor que durante longos anos, especialmente nestes últimos de apuro (quase) generalizado, terá (supostamente) escapado a todos os auditores, contadores, banqueiros, políticos, um fartote de anémonas cipriotas e europeias, o que nos remete para o conceito de zombie em part-time, já que esta (nova) extirpe, apenas zombieia em determinadas condições, normalmente por si ditadas, oscilando entre o modo zombie e o modo mais ou menos zombie quando se trata de assuntos irrelevantes como, por exemplo, aumentar impostos, diminuir salários, ou criar paraísos fiscais, coisa que nunca passou pela nem cabeça de Baudelaire ou De Quincey.

Estes e outros zombies em full-time, espécie muito em voga nas sociedades ocidentais, já foram sobejamente retratados nos filmes de Romero:


mas também do Carpenter:




A ilha de Chipre é pródiga em particularidades, estando dividida desde 1974 entre os cipriotas (Gregos) e os outros cipriotas (Turcos), antes por lá governaram com aproveitamento, os ingleses, os turcos otomanos, os venezianos e uma claque não oficial do Sporting. Um murete que ninguém reconhece nem quando lá esbarra com a cornadura, faz o seu papel de tampão. De um lado é a Europa, do outro, seja lá o que deus quiser. Entretanto, parece que há gás natural por perto, arregaçam-se as mangas e limpam-se as beiçolas da geoestratégia, enquanto se pede a uns que paguem (mais uma vez) a merda dos outros: coisa que lá, como cá, não falta. Enquanto isso, zombies de todas as extirpes assobiam ou não saem de cima. Estarão ao nível da série Walking Dead (que é mais fraquinha, - então a 3ª temporada): 




 [palhaço]

março 20, 2013

E o que sobeja*, sr. Azevedo, é que o resultado de toda a produção caminha em sentido contrário (o seu sentido)



O trabalhador aceita sob o eufemismo do contrato livre o que não passa de obrigações feudais, porque em parte alguma encontra melhores condições. Como tudo se tornou propriedade de um senhor, ele tem de ceder ou morrer de fome!
A empresa não se preocupa com as necessidades da sociedade; o seu único fim é aumentar os lucros do empresário. Daí as flutuações contínuas da indústria, as crises no estado crónico, – cada uma delas deitando para a rua centenas de milhares de trabalhadores.

“A conquista do pão” – La conquête du pain (pp.28), Kropotkine. Tradução de Manuel Ribeiro. Guimarães editores. 
(A edição original data de 1888. A primeira edição portuguesa é de 1910.)

[*ligação à posta anterior]

março 17, 2013

É a especialidade da casa, mas já não há


Mas a felicidade atinge o cúmulo quando se
persuadem que têm uma nova doutrina.
Erasmo (Elogio da Loucura)

Desliga a sanfona e vamos mas é beber um copo.
M. Naco (Obras incompletas até ver)


Companheiro de luta Relvas, sabemos que tem um plano. Também por isso, há que ser previdente e não dar demasiada corrente eléctrica à rádio televisão portuguesa, deixando-a em pousio, aguardando um assombro de luz viscosa que a incendeie por geração espontânea. O que vemos é um fartote de penumbra televisiva, quatrocentos golpes travestidos de galas, após o tombo temos direito a uma série de furúnculos segregando arredores de ficção, acolá uma tipa fala sobre fumo a sair de uma chaminé, diz que em Roma, e um outro com aroma a alheiras perto de Mirandela, em estúdio um (ia-mos jurar) ser humano dança enquanto entrevista um refugado e ali ao lado um painel de comentadores é revezado por um grupo de babuínos, sem que ninguém note diferença. Depois de tanta seiva um tipo já está a ferrar o dente ao sofá enquanto degusta a obra integral de Rodrigues dos Santos, como penitência.


É verdade, existem dois canais de convívio, fora os internacionais, no segundo estão sempre a aparecer leões, já os adoptámos de cor e salteado, no dia seguinte à sua exibição tornam a aparecer os mesmos leões mas a uma hora diferente, demonstrando-se assim que as suas reacções são sempre as mesmas independentemente da hora, diz que (aquilo) é um documentário, lá estão também as hienas para o provar. Por ali nunca se sabe quando vai aparecer um tipo qualquer de uma universidade privada de Cucujães ou de Santa Comba a debitar sobre os vestígios retardados do tv Rural e dos horizontes da memória, esta homónima de rtp. É verdade que a ausência total de ideias rumina sempre uma pergunta ou duas: que vamos meter entre o documentário dos leões e o 24horas? Quantas noites são, cinco? Mete-lhe um filme por noite e ficam aí cinco noites, cinco filmes. E foi assim que voltaram os filmes ao segundo.  

[tv = x]

Habemus...falta de carcanhol no bolso



 (in “Meaning of life”, Monty Python)

março 14, 2013

O ser humano como lugar público (ou como aos poucos também os micos, mirones, bufos e cuscos perderão a sua ocupação milenar)


RIOT. Uma tecnologia, no caso um software, criada com propósitos militares pela empresa Raytheon, à venda a quem quiser pagar por ela. O que oferece? Tudo sobre si: horários, hábitos de trabalho, alimentares, viagens, família, relações pessoais. Como? Com os dados que lhe dá de bandeja. Big Brother, olha para mim. Em cada fotografia tirada com o seu smartphone, que regista hora, data, latitude e longitude, em cada posta do seu Facebook, no cruzamento dos seus mil amigos desconhecidos com os seus familiares e colegas de escola, nos emails profissionais e pessoais, quando passa na portagem, em cada compra com o seu cartão de crédito, e com os seus cartões de cliente, nas ruas pejadas de câmaras onde passeia com os seus miúdos e o cão, está aberta uma porta que jamais voltará a fechar-se: a da sua vida (…).

Eugénia de Vasconcellos, jornal Público, versão em papel (13-03-13)

(artigo completo aqui)
[mira]

março 13, 2013

março 10, 2013

Também é frequente deliberarmos que naquele (outro) tempo é que era


(…) uma altura em que muitos europeus acreditavam que existia qualquer formula infalível para a realização de um multicentenário sonho de total e feliz desenvolvimento individual na liberdade e no progresso, e em que o século XIX expôs perante os olhos de milhões a sua prosperidade multifacetada e ilusória e criou a sua miragem de conforto, segurança e felicidade para cada um e para todos, e tudo a preços acessíveis e a crédito.

“A ponte sobre o Drina” (pp. 202), Ivo Andrić. Tradução de Lúcia e Dejan Stanković. Cavalo de Ferro.


Pretender que um grupo de indivíduos, mesmo os mais inteligentes e os mais bem-intencionados, sejam capazes de se tornar a ideia, a alma, a vontade dirigente e unificadora do movimento revolucionário e da organização económica do proletariado de todos os países, é uma tal heresia contra o senso comum e contra a experiência histórica que nos perguntamos, com espanto, como é que um homem tão inteligente como Marx pode tê-lo concebido.

Bakunine, (“Oeuvres” - 1872) In “História do Anarquismo” (pp.255), Jean Préposiet. Tradução de Pedro Elói Duarte. Edições 70.

março 09, 2013

Os cavalos também se abatem (II)



CAVALO – Se soubesse a força que tem, não se deixava montar. Carne de cavalo: bom tema para um homem que queira passar por pessoa séria, escrever um livro. Cavalo de corrida: desprezá-lo. Para que serve?

In “dicionário das ideias feitas”, Flaubert. Tradução de José Fonseca do Amaral. Estampa.

março 08, 2013

João Rocha (1930-2013)



Abri o olho para a bola era ele o presidente, então as regras do jogo pareciam simples e o Sporting era o maior do mundo. Puto, defendia o Sporting com unhas e dentes. Nessa altura sonhava-se com a cidade desportiva, vibrava-se com o futebol, mas também com o hóquei, o ciclismo, o atletismo, o andebol. Não necessariamente por esta ordem. Éramos mais que as mães: sócios, adeptos, praticantes. Jogávamos sempre em casa. Por isso, ver jogos no Norte era perto de Alvalade. Éramos diferentes. Agora já não sei.      

[Juve]

março 06, 2013

As minhas cassetes 101: Sonic Youth




dirty boots are on - hi di ho
pinking out the black - dreaming in a crack
Satan got her tongue - now it's undone

I got some dirty boots - yeah dirty boots

"Dirty boots", in Goo (1990), Sonic Youth.
[cassete completa]

março 05, 2013

Estaminé anacrónico



Por uma lei natural, o homem resiste às inovações, mas não vai até ao fim, porque, para a maioria, a vida é sempre mais importante e mais iminente que as regras com as quais se vive. Apenas os indivíduos excepcionais vivem um verdadeiro drama na luta entre o antigo e o moderno. Para esses, o modo de vida está ligado íntima e incondicionalmente à própria vida.

“A ponte sobre o Drina” (pp. 156), Ivo Andrić. Tradução de Lúcia e Dejan Stanković. Cavalo de Ferro. 

[imagem: extracto de uma das capas da edição Cavalo de Ferro]

março 04, 2013

E dantes as máquinas estavam sempre a avariar*



(GP)

Por exemplo, a indignação, não tarda, fará parte da superestrutura onde enfileira o capital e alinha o (des)governo desta nação (assim como outros (des)governos alinham noutras equipas do mesmo clube), e onde alinham os estaminés políticos, vulgo partidos, vulgo mercearias da clientela política com ramais de norte a sul. Os sindicatos e afins também alinham, notem bem que estes se desmarcam de qualquer estrutura inorgânica civil, dos cidadãos, até que estas se tornam organizações oficiais e passam a ser combatidas, basta atentar nos ódios de estimação à esquerda com compartimentos dentro de compartimentos, tipo as matrioskas russas, basta recordar a guerra civil Espanhola, para aqui chamada para nos recordarmos das démarches dos camaradas comunistas para controlar o poder do lado republicano (aniquilando os anarquistas e as cooperativas libertárias), e basta escutar as pessoas durante a semana para sabermos que os que se dignarem a votar o farão com a confiança e a sabedoria do ramerrame. 
A Indignação terá cartão próprio e hora marcada e será introduzida no normal funcionamento das coisas e das instituições, por exemplo, o ex-presidente do BCP, o senhor Filipe Pinhal, lidera já o Movimento dos Reformados Indignados, e brevemente o senhor Dr. Relvas liderará o movimento dos ex-governantes indignados que apenas arranjam grandes tachos, de preferência em empresas com quem lidaram no exercício das suas funções governativas. E, por exemplo, a este movimento, seguir-se-á um outro, o movimento do levantamento do cheque da reforma antecipada por préstimos à nação, calhando já com o código de reformado indignado. Entretanto, o ex-primeiro-ministro indignado seguirá as sábias pisadas do ex-ministro Sócrates ou do ex-ministro Durão o qual, visivelmente indignado com a falta de consideração indígena, se impôs uma temporada no limbo europeu, e voltará ao nosso querido inferno para nos tentar pastorear a indignação como presidente. O ex-presidente Cavaco, por exemplo, será então um indignado das reformas encavalitadas umas nas outras, aguardando a análise quimérica que fará justiça ao seu permanente silêncio de indignação. Ou será da indignação?


[fotografia publicada originalmente no Tio]

* título retirado da letra de uma canção dos GNR: "Pós modernos" (1986)

março 03, 2013

Não fosse ali o acento circunflexo e começaríamos a análise à indignação antes da abordagem ao jogo de ontem, mas como podem ver as coisas andam todas ligadas…



e queremos ter trabalho!

O exame ao jogo de ontem fica à mercê (olha aqui um circunflexo bem mostrado) do sumário do Cão. Bem vistas as coisas até existem por aí outros fiéis amigos, ou anjinhos. Neste momento continuo a minha reflexão sobre a temática da indignação. Desde logo o significado da palavra. Por exemplo, algumas palavras que esvaziaram de sentido à força de servirem para tudo e o seu contrário, e que se tornaram alegorias (ou folclore) de si próprias: ambiente, património, democracia, povo.

março 01, 2013

Diz que é uma espécie de comunismo utópico de reacção…



Sinto uma fúria enorme contra esta gente que nos governa e nos governou, considero-os piores que os salazaristas. As pessoas vivem no engano o tempo todo: porque têm direito a voto e os jornais podem criticar o poder político julgam que isso lhes dá algum poder soberano. O único poder que têm é o de irem colocar um voto na urna de quatro em quatro anos para fazerem uma escolha num horizonte limitado. A maneira suave com que age esta forma de ditadura é repugnante. É preferível a clareza da repressão a esta maneira de nos tirarem a alma, a honra, de fazerem de nós uns farrapos.

Paulo Varela Gomes em entrevista ao “Ípsilon”, suplemento do jornal Público (01-03-13).

Em comum teremos, aparentemente, a tendência para um certo anacronismo, acrescente-se o gosto pelo estudo da opinião dos visitantes estrangeiros sobre Portugal até ao séc. XIX, projecto que oscilou e caiu da minha cabeça como fruta madura sem ninguém que lhe valha, e pouco mais. Não tarda, terei que deitar o olho ao seu “O Verão de 2012”, quem sabe ainda em 2013?   

[ali]