“Que horror!”- suspirou a Lurdinhas na padaria, não se conseguindo imediatamente determinar se estaria a referir-se à temática da marcação das eleições ou ao corpo pouco delgado da menina Bastos que acabava de entrar. Mas, quem quer saber da marcação das eleições? Aparentemente, toda a gente quer saber. De repente é assunto interno no quintal. Posicionam-se os porta-estandartes. Discutem-se cenários e propõem-se datas. Novas poses se determinam: o plinto que sustenta o esqueleto da sra. que chefia o maior partido da oposição ( é assim que se diz?) surge-nos agora com um permanente sorriso acoplado, e o sr. Eng. vem de pastor evangélico trajando um fato de caixeiro-viajante e ostentando uma bonomia que já não se via desde as últimas aparições da Laurinda Alves; os restantes esbracejam. À sua volta o deserto comove-se. No café e na padaria surgem (já) os representantes do povo que nunca apareciam. Sabe-se sempre quem são pela bonomia ou sorriso dos respectivos mestres, e ainda por andarem de mesa em mesa sem consumirem nada. É certo que às vezes pagam um copo, mas pouco mais é digno de registo. Cá fora, e por todo o lado, fecham as “indústrias” que nos prometeram, e uns quantos ainda, sorriem para a despensa quando chegam a casa. As montras tragam-nos para dentro dos 50% de desconto, num vórtice ainda mais comovente que os anteriores. A rua está triste e pejada de sacrifícios vãos. O campo desapareceu ou foi substituído pela visitinha com hora marcada. As cidades pequenas ou grandes prestam vassalagem à metrópole: todos cobiçam a diversão da metrópole. E verdadeiramente, como sustentou Spengler, cerca de noventa anos atrás, todo o espectáculo desagua na “esterilidade do homem civilizado”.
“Não foi para isto que viemos”, dizia-me o Alfredo à saída da padaria. Fiquei sem saber ao que ele se referia…
“Não foi para isto que viemos”, dizia-me o Alfredo à saída da padaria. Fiquei sem saber ao que ele se referia…
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